Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil - 066 ARQUIPÉLAGO DE FERNANDO DE NORONHA Data: 27/01/2000 FERNANDO F.M. DE ALMEIDA © Almeida,F.F.M. 2000. Arquipélago Fernando de Noronha. In: Schobbenhaus,C.; Campos,D.A.; Queiroz,E.T.; Winge,M.; Berbert-Born,M. (Edit.) Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil. Publicado na Internet
em 27/01/2000 no endereço http://www.unb.br/ig/sigep/sitio066/sitio066.htm [Atualmente
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RESUMO
Fernando de Noronha é um
pequeno arquipélago vulcânico situado no Atlântico Sul equatorial, a 350 km de Natal.
É constituído de rochas do alto de um monte vulcânico que faz parte da cadeia homônima
desenvolvida numa zona de fraturas oceânicas orientadas a E-W. Tem cerca de 18,4 km²,
90% dos quais na ilha principal que lhe dá o nome. Além dela possui 18 pequenas ilhas,
que se destacam acima de uma reduzida plataforma insular que trunca a montanha vulcânica
a até cerca de 100 m de profundidade. As rochas são vulcânicas e subvulcânicas
fortemente alcalinas e subsaturadas. Representam dois episódios vulcânicos maiores cujos
produtos constituem as formações Remédios e Quixaba. As do mais antigo, datado do
Mioceno Superior, são piroclastos penetrados por domos, plugs e diques
fonolíticos e traquíticos e por numerosos diques de variados tipos de rochas alcalinas.
Processos erosivos destruíram as rochas vulcânicas desse ciclo, seguindo-se Quixaba, do
Plioceno Superior, representado por derrames de ankaratritos, rochas piroclásticas e
raros diques de nefelinito. O arquipélago tem população de pouco menos de 3.000
habitantes, concentrados na ilha principal, e pequena população flutuante de turistas e
pesquisadores. É um Parque Nacional Marinho. Tem clima agradável, belo relevo, lindas
praias e mar muito limpo, com golfinhos, tartarugas e muitos peixes. Acessível a aviões,
constitui um importante atrativo turístico, embora não disponha de estrutura adequada. O
turismo não é incentivado, objetivando a preservação da ecologia.
ABSTRACT
Fernando de Noronha is a small volcanic
archipelago in the equatorial South Atlantic, 350 km off the city of Natal, the Rio Grande
do Norte State capital, northern Brazil. The archipelago consists mainly of highly
alkaline and subsatured volcanic and subvolcanic rocks and are part of a homonymous
volcanic mountain developed along an E-W oceanic fracture zone. It encompasses an area of
18.4 km², 90% of which within the main island. There are also 18 minor islands
outcropping on a reduced island platform that truncates the volcanic mountain as deep as
approximately -100 m. The Remédios and Quixaba formations represent two major
volcanic episodes. The former one, dated Upper Miocene, comprises pyroclastics intruded by
phonolite and trachyte domes, plugs and dikes, as well as by a number of dikes showing a
varied types of alkaline rocks. Erosion processes destroyed the volcanic rocks from this
cycle, and was followed by the Quixaba Formation, during the Upper Pliocene, represented
by ankaratrite lava flows, pyroclastic rocks and rare nefelinite dikes. The archipelago
has a population of no more than 3,000 inhabitants, concentrated in the principal island,
and a small floating population of tourists and researchers. It is a Marine National Park
accessed by air flights, offering a pleasant weather, beautiful landscapes, wonderful
beaches and very clean seawater, with dolphins, turtles and many fish types. Despite of
its natural attractions, the tourism has not been stimulated, not only due to the poor
available infrastructure, but also to preserve the local ecology.
INTRODUÇÃO
O estudo das pequenas ilhas oceânicas oferece um especial interesse científico pelas informações que pode trazer sobre a natureza da crosta oceânica e os processos relacionados com sua expansão. Além disso, podem constituir sítios aprazíveis para o turismo (Figura 3) e importantes pesquisas ecológicas.
SITUAÇÃO
O arquipélago situa-se no Atlântico Sul equatorial a 3º 51' S e 32º 25' WG (Figura 1). Constitui-se de uma ilha principal que lhe dá o nome, com cerca de 16,4 km² que representam 91% da área do arquipélago. Rodeiam-na 20 ilhotas das quais Rata (Figura 4), a maior, tem 81 ha. Elevam-se de uma plataforma de erosão com cerca de 3 a 4 km de largura e até uns 100 m de profundidade, além da qual crescem rapidamente os fundos para comporem um monte cônico com cerca de 60 km de diâmetro na base apoiada no assoalho oceânico a 4.000 m de profundidade. Essa montanha participa de um alinhamento de montes vulcânicos submarinos que compõem a Cadeia de Fernando de Noronha, orientada a E-W, na zona de fratura do mesmo nome. Na projeção desse alinhamento em direção à costa do Ceará apresenta-se o guyot do Ceará, que interrompe o talude continental. Nos arredores de Fortaleza ocorrem rochas intrusivas da mesma natureza que as de Fernando de Noronha, tendo Cordani (1970) datado fonólito que acusou idade de cerca de 30 Ma. Tais fatos sugerem que a zona de fraturas afetou a borda da crosta continental. O atol das Rocas também é um guyot vulcânico dessa cadeia, arrasado pelo mar e inteiramente coberto por recifes de algas Lithothamnium e areias provenientes de organismos marinhos.
Figura 1 - Situação do
Arquipélago de Fernando de Noronha em relação à costa brasileira
Figure 1 - Situation of the Fernando
de Noronha Archipelago at the Brazilian coast
Figura 2 - Mapa geológico de Almeida (1955)
simplificado por M.C.N. Ullbrich (1994). Abreviaturas: B, baía; E, enseada; I, ilha; M,
morro; Pr, praia; Pt, ponta
Figure 2 - Geological map of Almeida
(1955) as simplified by M.C.N. Ullbrich (1994). Abbreviations: B, bay; E,
Figura 3 - Vista da praia do Leão, no lado E da
ilha principal. Foto G. Barreto, rev. Terra, dez 1999, p. 31
Figure 3 - Leão beach, at the E
side of the main island. Photo G. Barreto, rev. Terra, dez 1999, p. 31
Figura 4 - Ilha Rata. Foto G. Barreto, rev. Terra,
dez 1999, p. 33
Figure 4 - Ilha Rata. Photo G.
Barreto, rev. Terra, dez 1999, p. 33
HISTÓRICO
O arquipélago foi descoberto oficialmente por
Américo Vespúcio em 1503 e recebeu no ano seguinte o nome de um fidalgo português,
Fernão de Loronha, a quem foi doado pela Coroa. Foi ocupado pelos holandeses em 1612 e
1635-1654 e franceses em 1736, logo expulsos pelos portugueses, que então fortificaram a
ilha principal. Na segunda metade do século XIX foi visitado por diversos investigadores
estrangeiros, desde que C. Darwin (1839), que nele esteve em l832 na histórica viagem do Beagle,
divulgou suas observações sobre a geologia e petrografia, e a natureza vulcânica da
ilha principal. Amostras de rochas coletadas por essas expedições foram estudadas por
diversos petrógrafos, destacando-se Smith e Burri (1933). Deve-se a Branner (1888, 1889,
1890) descrições mais específicas sobre a geologia do arquipélago e posição ocupada
por muitas das rochas coletadas e descritas por vários investigadores. Ele fez
interessantes observações sobre os calcarenitos, dunas e praias do arquipélago. Na
primeira metade do século XX foi grande o descaso pelos estudos de geologia e petrografia
do arquipélago, mas em 1948 o Departamento Nacional da Produção Mineral enviou a ele o
engenheiro Pouchain, que no ano seguinte teve publicados os resultados de suas
investigações relativas aos fosfatos e calcarenitos da ilha Rata. O presente autor, como
engenheiro desse Departamento, teve oportunidade de realizar três viagens ao
arquipélago, quando executou seu mapa geológico (Figura 2) em escala 1:15.000 e realizou estudos
sobre sua geomorfologia, petrografia, história geológica, geoquímica e petrogênese
(Almeida, 1955). Trabalhos publicados posteriormente analisaram sobretudo os aspectos
geoquímicos (Gunn e Watkins, 1978; Gerlach et al. 1987; Schwab e Block, 1985; Weaver,
1990; Ulbrich et al., 1994). Ulbrich (1994) descreveu a petrografia e discutiu a
diversificada nomenclatura e classificação das rochas do arquipélago. Cordani (1970)
datou várias de suas rochas pelo método K-Ar. Maringolo (1994) elaborou tese sobre os
diques da ilha principal.
O arquipélago tem sido sucessivamente
administrado por diversos orgãos governamentais, pertencendo hoje ao Estado de
Pernambuco.
DESCRIÇÃO DO SÍTIO
Aspectos Geográficos
Fernando de Noronha apresenta relevo modesto para uma ilha vulcânica oceânica. Em sua região central existe um baixo platô a cerca de 30 a 45 m sobre o mar que resulta de uma superfície de erosão esculpida em tufos e brechas vulcânicas em condições subaéreas. Dele se elevam morros de rochas fonolíticas (Figura 5) dos quais o mais alto e também o mais elevado da ilha, é o do Pico (321 m), uma curiosa forma de erosão devida à queda de blocos de juntas (Figura 6). Morros fonolíticos destacam-se dessa área aplainada, na qual foi construída a pista de aviação. Esse platô central é ladeado por dois planaltos de relevo suavizado que se elevam a altitudes de 150-200 m. Ambos se constituem de rochas piroclásticas alternadas com derrames de lava ultrabásica nefelínica (ankaratrito). Apresentam escalonamento obedecendo ao declive suave dos derrames. Terminam em talude moderado em direção à costa, ou ainda em elevadas falésias. Os traçados dos vales, normalmente secos, são muito influenciados pela estrutura geológica e têm origem nos morros fonolíticos. As pequenas ilhas do arquipélago oferecem aspectos diversos, de acordo com sua constituição geológica. As fonolíticas apresentam-se como picos destacados (ilhas do Frade, Sela Gineta, Cabeluda). As de derrames de lava são tabulares, como Rata e São José, ou rochedos escarpados (Dois Irmãos). As ilhas formadas por calcarenitos são baixas e de relevo tabular (ilhas do Meio e Rasa).
Figura 5 - Aspecto da superfície de erosão do
platô central. Morros em fonólitos. Foto F.F.M. Almeida
Figure 5 - Aspect of the erosion
surface of the central plateau. Mountains on phonolite. Photo F.F.M. Almeida
Figura 6 - Morro do Pico. Relevo residual em
fonólito. Foto F.F.M. Almeida
Figure 6 - Pico Mountain. Residual
relief in phonolite. Photo F.F.M. Almeida
Junto às bordas sul e oriental da ilha principal, mais expostas ao embate das vagas originadas pelos ventos alísios, existem falésias nas lavas; são abundantes os recifes de algas Lithothamnium e escassas as praias arenosas, que têm maior desenvolvimento no litoral norte. Dunas ativas existem junto às praias arenosas do litoral norte. Níveis marinhos antigos são presumíveis ou reconhecíveis na ilha principal. O mais alto serviu de nível de base para a erosão que esculpiu o planalto central. Estaria a uns 30 m acima do nível atual do mar. Outro é atestado pela presença de calcário marinho formado por algas Lithophyllum nas vizinhanças do porto, na península de Santo Antônio (Figura 7). Depósitos de praia contendo seixos rolados, restos de peixes, corais e outros organismo marinhos existem nessa península elevados a 7 m sobre o nível do mar e afastados 70 m da linha de costa. Depósitos semelhantes em outros locais podem ser reconhecidos a até 12 m sobre o nível do mar atual. O arenito das Caracas, que descreveremos adiante, é posterior a esse nível, pois recobre seus depósitos. Esse arenito formou-se quando o nível do mar se achava a uns 6 m abaixo do atual. Extensas praias existiam então a sul e leste do arquipélago e dunas de areia calcária cobriam as atuais ilhas a nordeste (Figura 8). Conglomerados e arenitos antigos na pequena ilha Chapéu de Nordeste, Rata e outras repousam sob o arenito eólico Caracas.
Figura 7 - Calcário marinho em terraço a 9 metros
acima do nível do mar. Península de Santo Antônio. Foto F.F.M. Almeida
Figure 7 -
Marine limestone in a
terrace 9 m above sea level. Santo Antônio Peninsula. Photo F.F.M. Almeida.
Figura 8 - Baía de Sueste, vale fluvial inundado
com a elevação do nível do mar. Na barra, restos de antigas dunas consolidadas (arenito
das Caracas). Foto F.F.M. Almeida
Figure 8 - Sueste Bay, a flooded
fluvial valley after the elevation of the sea level. In the bar, rests of ancient
consolidated dunes (Caracas arenite). Photo F.F.M. Almeida
O clima do arquipélago, do tipo Awi, é
semelhante ao da costa oriental do Rio Grande do Norte. Tem duas estações bem marcadas,
a chuvosa de fevereiro a julho. Persistentes ventos alísios sopram de ENE.
A vegetação original foi quase toda destruída..
Hoje, o revestimento vegetal constitui-se de escassa vegetação arbustiva ou arbórea de
pequeno porte e grandes áreas de macega, ervas e gramíneas.
Geologia Regional
Fernando de Noronha é um arquipélago em que se
expõem rochas vulcânicas de idades miocênica e pliocênica. Constitui-se de um
substrato de rochas piroclásticas penetradas por grande variedade de magmáticas
alcalinas que, após prolongado hiato, foram recobertas por derrames de rochas
ultrabásicas nefelinícas (ankaratritos) e seus piroclastos. Como sedimentos ocorrem nas
ilhas reduzidos depósitos litorâneos, marinhos e eólicos, pertencentes ao ciclo atual e
a outros, do Quaternário.
As rochas mais antigas, reconhecíveis in situ
no arquipélago, constituem a Formação Remédios (Almeida, 1955). São magmatitos
intrusivos em piroclastos variados e que suportam as maiores elevações da parte central
da ilha principal. As rochas piroclásticas parece que só afloram nessa ilha.
Constituem-se de fragmentos de diversas dimensões, sem qualquer classificação por
tamanho, podendo atingir blocos com um metro ou mais de diâmetro. Podem formar camadas
irregulares de tufos, brechas e aglomerados. Entre os fragmentos destacam-se variedades de
rochas fonolíticas, traquíticas e essexíticas. Sua espessura exposta pode exceder 100
m. Elas resultam dos paroxismos explosivos que precederam e acompanharam a intrusão dos
corpos fonolíticos e traquíticos.
Reconhecem-se na ilha principal onze grandes
corpos independentes de rochas fonolíticas. O que contém o Pico tem 950 m2
expostos fora do mar, valor que atinge 1.070 m2 no domo da Boa Vista. Diques
fonolíticos são freqüentes, alguns com vários metros de espessura. Os domos e plugs
fonolíticos de Fernando de Noronha são de consolidação endógena, expostos pela
erosão realizada antes que se processassem as efusões ankaratríticas. De resto, todas
as rochas magmáticas da Formação Remédios são endógenas, como se conclui de suas
juntas, estruturas laminares e modo de ocorrência. Uma pequena mas interessante estrutura
dômica formada por traquito ocorre na praia do Leão, no costa sul das ilha, mas a
expressão mais comum desse tipo de rocha é sob forma de grandes diques.
Ocorrem em Fernando de Noronha numerosos diques de
rochas lamprofíricas sódicas: monchiquitos, furchitos, camptonitos e outros tipos raros,
constituindo a maioria dos diques bem observados à beira-mar (Figura 9). Também existem
diques de ankaratrito, augitito, álcali-traquito, limburgito, sanaíto, olivina
teschenito, essexito pórfiro, olivina-nefelinito, basanito, gauteíto e outras rochas. A
nomenclatura petrográfica de muitos desses diques, como de outras rochas da ilha, é até
hoje controvertida (Ulbrich, l994; Maringolo, 1994). A orientação predominante desses
diques varia entre NW e NE. Fonólitos, traquitos e essexitos pórfiros são aparentemente
as rochas magmáticas mais antigas expostas na ilha.
Figura 9 - Diques de monchiquito na falésia da
ponta de Atalaia. Foto F.F.M. Almeida
Figure 9 - Monchiquite dikes at the
shore cliff of the Atalaia Point. Photo F.F.M. Almeida
As rochas fortemente melanocráticas, em que
feldspatos são muito escassos quando não ausentes, são as mais recentes da Formação
Remédios. Equivalentes efusivos de algumas dessas rochas devem ter existido no alto do
edifício vulcânico, mas foram destruídos pela erosão que precedeu os derrames
ankaratríticos.
Mereceu atenção o estudo dos xenólitos e
ejetólitos da Formação Remédios por representarem possíveis rochas muito profundas do
edifício vulcânico. Entre seus clastos predominam rochas reconhecidas em afloramentos na
ilha principal, porém identificamos algumas que nela não parece ocorrerem, como sienitos
nefelínicos e hornblenda gabros.
A Formação Quixaba (Almeida, 1955)
constitui um empilhamento de negros derrames de lava ankaratrítica alternados com
piroclastos de componentes da própria lava. Aflora nos dois planaltos escalonados da
ilhas principal, no oriental podendo-se reconhecer até 180 m de espessura exposta acima
do nível do mar. A formação constitui algumas ilhas, com destaque para a ilha Rata. Os
derrames, quando não são horizontais, apresentam inclinações de até 30º para sul,
sentido do escoamento das lavas. Os derrames são maciços em seu interior porém
vesiculares ou amigdaloidais na base e sobretudo no topo (Figura
10). Sua espessura varia,
podendo ultrapassar 40 m na falésia da baía do Sancho, mas geralmente apresenta alguns
metro somente. Vimos derrames de melilita ankaratrito (Figura
11) com menos de dois
centímetros de espessura, alternados com tufos lapílicos contendo bombas do mesmo
material. As rochas piroclásticas são tufos, tufo-brechas, lapilli-tufos e aglomerados,
constituídos essencialmente de componentes provenientes dos derrames, inclusive cristais
isolados. Blocos angulosos de lava alcançam 2 m. Não são raros perfeitas bombas e
fragmentos de lava cordada. Quando não constituem um conjunto caótico de fragmentos de
variadas dimensões, podem mostrar-se com estratificação grossa ou, localmente, em
estratos finos, bem acamados. Uma estrutura que nos chamou atenção é a chaminé de
Tamandaré, na extremidade nordeste da ilha principal. Tem cerca de l30 m de diâmetro e
perfura o derrame inferior. Suas paredes, em ankaratrito, têm restos de tufo e aglomerado
de chaminé, sendo atravessadas por diques. A maré baixa descobre a lava escoriácea de
seu interior. Foi local de escape de soluções, onde se formou muita calcita que, em
perfeitos escalenoedros, preenche fraturas nas brechas e aglomerados. Diques de nefelinito
de granulação grossa foram vistos em poucos locais da ilha principal.
Figura 10- Três derrames de lava ankaratrítica na
ponta das Caracas. Foto F.F.M. Almeida
Figure 10
Figura 11 - Delgados derrames de melilita ankaratrito
contendo bombas da mesma rocha. Falésia da praia de Quixaba. Foto F.F.M. Almeida
Figure 11 - Thin flows of melilite
ankaratrite containing bombs of the same rock. Shore cliff at the Quixaba beach.
Photo F.F.M. Almeida
As pequenas ilhas São José, Cuscuz e de Fora, vizinhas à terminação norte da península de Santo Antônio, são constituídas de um mesmo derrame horizontal de basanito cuja espessura original excede 25 m (Figura 12). Os ankaratritos da referida ponta, assim como os do sopé da ilhota Chapéu de Nordeste, descobertos em maré baixa, têm inclinação para NE, o que levou o autor a supor ser o basanito mais novo que a Formação Quixaba, tendo-lhe atribuído o nome de Formação São José. Chama atenção nesse derrame a abundância e dimensões dos xenólitos de dunito de cor verde-garrafa, constituídos quase inteiramente de olivina. Ulbrich (1994) refere também xenólitos de lherzolito e harzburgito. Têm formas angulosas a subarredondadas (Figura 13) e vimo-los com diâmetro de até 35 cm. São fragmentos de corpo rochoso volumoso englobados pelo magma e por ele trazidos à superfície. Na ilha de São José percebe-se que os maiores e mais numerosos xenólitos são encontrados na parte inferior do derrame, como resultado de um processo de decantação. Possivelmente procedem de zona profunda e antiga do manto superior. Apesar de as idades obtidas por Cordani (1970) para o basanito da ilha de São José serem anteriores às da Formação Quixaba, elas podem ser enganadoras, pois a rocha está contaminada com xenólitos de olivinito mantélico. Schwabe e Block (l985) concluíram que esse basanito mostra relações geoquímicas com a Formação Quixaba. Também Ulbrich (1994) acha que essa rocha não deve ser considerada uma formação, mas provavelmente representa a culminação do vulcanismo Quixaba e pode ser correlacionada petrograficamente aos basanitos de uma chaminé que atravessa os ankaratritos na baía do Sancho, identificada por Ulbrich e Ruberti (1992).
Figura 12 - Derrames basálticos cobertos pelo
arenito das Caracas. Ilha de São José. Foto F.F.M. Almeida
Figure 12 - Basalt flows covered by
the Caracas arenite. São José Island. Photo F.F.M. Almeida
Figura 13 - Xenólitos de dunito no basanito da
ilha de São José. Foto F.F.M. Almeida
Figure 13 - Dunite xenoliths in the
basanite of the São José Island. Photo F.F.M. Almeida
MEDIDAS DE PROTEÇÃO DO SÍTIO
A ilha Fernando de Noronha, no Parque Nacional Marinho homônimo estabelecido em 1988, é tida por muitos dos que a visitaram como sendo a mais bela ilha do Brasil. Tem hoje população estável de pouco menos que 3.000 habitantes e uma quantidade flutuante de turistas, ambas numericamente sujeitas a limitação. O turismo foi estabelecido a partir da década de setenta, havendo hoje vôos diários para a ilha desde Recife e Natal. Contudo, há fatores que restringem esse turismo. A ilha é distante; uma taxa de permanência diariamente crescente é cobrada (Maciel Filho, 1999); ela não possui uma infra-estrutura turística, havendo somente um hotel proveniente da adaptação de instalações da base aérea americana existente durante a Segunda Guerra Mundial. Há algumas pousadas na região vizinha à vila dos Remédios, na região oriental da ilha. Existem vários caminhos acessíveis a veículos motorizados, mas só uma estrada asfaltada, de sete quilômetros. A beleza de suas paisagens, o clima agradável, o espetáculo dos golfinhos que pela manhã permanecem numa enseada, as tartarugas marinhas, as belas praias e o mar de águas muito limpas e cheias de peixes constituem grandes atrativos turísticos. As atuais limitações impostas ao turismo e a vigilância exercida pelos fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA), do Projeto Golfinhos Rotadores, (pesquisas sobre esses cetáceos) e do Projeto Tamar (proteção à desova das tartarugas) parecem-nos garantias suficientes para a preservação adequada da ecologia do arquipélago, que foi muito danificado no passado, quando teve sua mata original destruída.
AGRADECIMENTOS
- O autor agradece ao Prof. Dr. C.D.R. Carneiro pela avaliação do texto e elaboração das figuras; ao Prof. Dr. R.P. Xavier pelas sugestões sobre o texto em Inglês, que possibilitaram aprimorar o manuscrito; a Mabel H.C. Ulbrich pela cessão do mapa simplificado do arquipélago e a Marcelo Reginato, pela elaboração do esboço da figura 2.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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