Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil - 032 O SÍTIO FOSSILÍFERO DE PIRAPOZINHO, SP Data:23/09/1999 JOSÉ MARTIN SUÁREZ © Suarez,J.M. 1999. O sítio fossilífero de Pirapozinho, SP. In: Schobbenhaus,C.; Campos,D.A.; Queiroz,E.T.; Winge,M.; Berbert-Born,M. (Edit.) Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil. Publicado na Internet em 23/09/1999 no endereço http://www.unb.br/ig/sigep/sitio032/sitio032.htm [Atualmente https://sigep.eco.br/sitio032/sitio032.htm] Versão Final Impressa: (A referência bibliográfica de autoria acima é requerida para qualquer uso deste artigo em qualquer mídia, sendo proibido o uso para qualquer finalidade comercial) |
RESUMO
As pesquisas paleontológicas no extremo oeste do Estado de São Paulo, mormente na região mais conhecida como Pontal do Paranapanema, apesar de terem sido noticiados com freqüência achados fósseis, não tiveram uma pesquisa sistemática, até alguns anos atrás. Durante os trabalhos de campo realizados com a finalidade de estabelecer mais detalhadamente a geologia regional, foi descoberto pelo autor, um sítio fossilífero, contendo grande quantidade de material queloniano, bem como restos de peixes (ganóides), crustáceos e carófitas no ramal de Dourados (hoje desativado) da antiga Estrada de Ferro Sorocabana, entre os municípios de Presidente Prudente e Pirapozinho. Com a extinção do ramal, a retirada dos marcos, a erosão e a invasão da vegetação tomaram conta do lugar ocultando em grande parte, principalmente para o leigo, os fósseis, reduzindo bastante a depredação à que esteve submetido.
ABSTRACT
The paleontological research in the western of the São Paulo State, in the
region kwown as Pontal do Paranapanema, at the center of Paraná Basin, although
noticed, fossils finding sometime, they do not have had a sistematic researching
until some years ago. During the field work with the purpose of the regional
geology surveying, it was discovered by the autor an extraordinary fossiliferous
bed containing many quelonious, carophytas, ostracoda, dinosauria and fish rest
in the branch line of the Sorocabana Railroad (today disabled), between
municipalities of Pirapozinho and Presidente Prudente. With the branch
extintion, the retreat of marks, soil erosion and the vegetation take over of
the site, hiding the local fossils to curious people, dropping the spoil was
submitted.
INTRODUÇÃO
A antiga Estrada de Ferro Sorocabana na década do 50, deu início à realização de um projeto que levaria uma ferrovia até Dourados (MS), atravessando o Pontal Paranapanema. A obra exigiu o feito de numerosos cortes para a passagem dos trilhos, propiciando a oportunidade de se examinar as estruturas sedimentares nas secções. A ferrovia funcionou até alguns anos atrás quando foi desativada, restando apenas o leito. Em um desses cortes, no km 736,1 (correspondendo às coordenadas latitude 22o13’08’’ S; longitude 51o25’59’’ W e altitude 402,96 metros) localizado, praticamente na divisa entre os municípios de Presidente Prudente e Pirapozinho (Figura 1), apareceu uma grande quantidade de fósseis sendo surpreendente a predominância de material queloniano (Figura 2). O depósito se estende até o km 734. Os quelônios, a maioria da espécie Podocnemis elegans e espécimes mais escasos de Roxochelis wanderleyi, estão repartidos nesses 2 km , porém em alguns lugares estão amontoados formando uma estrutura algo imbricada (Figuras 3 e 4). Além do material queloniano encontram-se ao longo do afloramento, restos de répteis, lamelibrânquios, carófitas e de crustáceos (ostrácodes), todos eles já estudados ou sendo estudados por diversos pesquisadores (Mezzalira, 1966, 1973; Suárez, 1968, 1973; Suárez & Campos, 1995; Dias-Brito et al., 1998). As rochas onde se encontram na sua maioria, são arenitos finos e arenitos siltosos, exibindo micro estruturas de correntes, bem compactadas e freqüentemente com cimento calcífero.
Figura 1 -
Localização do Sítio Fossilífero (Pirapozinho, São Paulo).
Figure 1 -
Fossils site localization (Pirapozinho, São Paulo state).
Figura 2 - Vista Geral do Sítio Fossilífero no Ramal de Dourados (Antiga Estrada de Ferro
Sorocabana, hoje extinto).
Figura 2 - General view of the fossils site at Ramal de Dourados(Sorocabana
Railroad, today extint).
Figura
3 - Disposição dos Fósseis no local, com o predomínio de Podocnemis elegans.
Figure
3 - Fossils
disposition at km 736,2, showing some exemplars of Podocnemis
elegans.
Figura 4 - Detalhe da disposição dos fósseis no local.
Figure 4 - Fossils disposition detail at the site.
GEOLOGIA A Figura 5 (perfil geológico e litologico) dá uma idéia da natureza e disposição das camadas no marco 736,1 e a explicação é a seguinte:
Figura 5 -
Perfil Geológico e litológico no km 736,1.
Figure 5 - Geological and lithological section in
km 736.1.
Estas rochas pertencem à Formação Adamantina do Grupo Bauru, Cretáceo Superior e se estendem por todo o Planalto Ocidental Paulista e parte do Estado de Minas Gerais, na bacia do Paraná. Num poço aberto em Pirapozinho, o Grupo tem uma espessura de 230 metros. Os afloramentos em superfície são muito mais restritos do que os indicados no mapa geológico do Estado de São Paulo por causa da cobertura de sedimentos cenozóicos, de forma que os afloramentos no campo são visíveis apenas nas encostas, vertentes e talvegues dos rios. As rochas do Grupo Bauru são muito fossilíferas, especialmente as formações Adamantina e Marília. Litologicamente estão representadas por arenitos, siltitos, argilitos e conglomerados de origem fluvio-lacustre e como sugere o exame das estruturas sedimentares e a natureza dos fósseis devem ter sido depositadas sob um clima quente e úmido. Os estratos são muito resistentes à erosão, freqüentemente pela presença de cimento calcífero ou silicoso.
ESTRATIGRAFIA
Não nos deteremos numa exposição minuciosa da estratigrafia, que não é o
objetivo deste trabalho. Para mais detalhes remetemos o leitor à bibliografia
existente.
Na área estudada (Oeste do Estado de São Paulo), as rochas
existentes pertencem ao Grupo Bauru (Cretáceo) e Cenozóicas.
O Grupo Bauru, ocupando a parte central da bacia do Paraná,
chega a atingir uma espessura de 300 metros. Da base ao topo, tem-se as formações
Caiuá, Santo Anastácio e Adamantina. A Formação Marília não está presente
na área.
Formação Caiuá
Esta Formação foi estudada por vários autores, entre eles,
Washburne (1932), Scorza (1952), Freitas (1973), Suárez (1973) e
Landim et al. (1980). Está constituída por arenitos finos a médios de
cor arroxeada a violeta e marrom escuro, com estratificações cruzadas de
grande porte. Os grãos de quartzo estão cobertos por uma fina camada de óxido
de ferro. O contato com a Formação Santo Anastácio é transicional. Esta
Formação só é visível nas margens dos rios Paraná e Paranapanema e nas de
alguns afluentes desses rios. Verifica-se, pelo exame de testemunhos de poços,
que se estende em subsuperfície pelos estados de São Paulo, Paraná e Mato
Grosso do Sul. Não foram encontrados fósseis, a não ser, pegadas de ichnofósseis.
Leonardi (1977), noticiou a existência de duas ichnofaunas atribuídas a um Terópoda
e com ressalvas a Therapsida em Cianorte (PR). Sua espessura máxima na região
está em torno de 70 m em Presidente Epitácio (SP).
Quanto
ao ambiente de deposição uns optam pelo aquoso e outros pelo eólico. O autor
optou por um ambiente misto, por causa da presença de mica (muscovita), do
estado da superfície dos grãos (Suárez, 1973) e ainda pela estratificação
cruzada de grande porte.
Formação Santo Anastácio
Está composta por arenitos finos a médios, pobres em estruturas sedimentares e apresentando leitos de argilito de cor marrom de pequena espessura, bem como nódulos de arenito com cimento calcífero de formas irregulares. Possui uma espessura variável na região da ordem de 70 m. O ambiente de deposição deve ter sido, segundo Soares & Landim (1980), “um modelo fluvial meandrante de transicional para anastomosado essencialmente arenoso”. Na região pode-se observar, em alguns afloramentos do Grupo, uma mudança de litologia brusca em relação com a parte basal da Formação Adamantina, indicando algum hiato na sedimentação. Seu conteúdo fossilífero restringe-se até agora, à presença de charáceas.
Formação Adamantina
É a de mais ampla distribuição dentro da área e distingue-se bem das duas
anteriores por causa das mudanças de litofácies tanto horizontal, como
verticalmente. Os afloramentos apresentam uma grande variação de estruturas
sedimentares de natureza hidrodinâmica mostrando, em alguns afloramentos,
ritmicidade na sedimentação. Ainda são frequentes a estratificação cruzada
acanalada, ondulas de oscilação e translação freqüentes em alguns níveis,
paleocanais e lentes de argilito. Em geral os arenitos são finos a médios de
cor rosada, às vezes com pequenos nódulos milimétricos de argilitos e
siltitos. Frequentemente os estratos de arenito estão cimentados com carbonato
de cálcio, argila e em outros casos com cimento silicoso. Este último tipo de
cimentação é mais frequente nas proximidades e no vale do Rio Paranapanema,
embora se encontre presente também, distante desses locais.
Deve-se
mencionar a existência de uma camada intraformacional (altitude 420 metros) de
espessura variável de um microconglomerado compacto duro, com cimento calcífero
e estratificação cruzada. Tal camada foi reconhecida em lugares distantes
entre si, como na região de Uberaba (MG) e em vários municípios desta região.
Contém bastante fósseis, todos evidenciando transporte.
A
maior parte dos fósseis no Grupo Bauru é encontrada na F. Adamantina, mais
freqüentemente na parte média e superior, sendo restos de moluscos, peixes,
quelônios, crocodilídeos, dinossauros, saurópodas, carófitas (Arid, 1967;
Mezzalira, 1974; Suárez, 1968, 1973, 1998, Dias-Brito et al., 1998), indicando
um clima quente, úmido, com períodos áridos e semi-áridos.
O ambiente de deposição desta
unidade é considerado, por seus pesquisadores, como tendo sido flúvio-lacustre.
A idade da F. Adamantina, segundo
Dias-Brito et al. (1998), pelo estudo dos microfósseis calcáreos, estaria localizada no
Cretáceo Inferior e o intervalo sugerido post-Cenomaniano ao pré-Campaniano
(Turoniano-Santoniano). Soares & Landim (1980), atribuíram idade do Cretáceo Médio,
Cenomaniano a Santoniano havendo, assim, uma certa concordância entre esses autores.
Cenozóico
TERCIÁRIO
Em toda a região as rochas do Grupo Bauru estão cobertas por uma camada sedimentar de um arenito vermelho argiloso, onde se encontram seixos esparsos de quartzo e de arenito, muito friável de origem coluvionar e de espessura que pode atingir 10 metros. Lepsch (1977), assinalou sua existência na região de Echaporã, e Suárez (1991) já as mencionava na região do Pontal do Panapanema, mapeando-as. Apesar de sua extensão, posição estratigráfica e características físicas, não constam do Mapa Geológico do Estado de São Paulo. Por isto, os afloramentos do Grupo Bauru, em superfície, são bastante restritos sendo visíveis apenas nos cortes das estradas, no fundo das erosões (voçorocas) e nas encostas. Estes sedimentos jazem sobre o Grupo em discordância erosiva, não raro com seixos na interface. Devido à ausência de fósseis é difícil precisar sua idade, provavelmente localizada no Mioceno.
QUATERNÁRIO
Resta mencionar os depósitos quaternários ocupando o fundo dos vales e constituídos pelo material típico da Era: areias, silte, argilas, seixos, conglomerados, etc. A existência de restos de mamíferos pleistocênicos, Toxodon platensis e Lestodon trigenidens , localizados no município de Álvares Machado (Carvalho (1952); Cunha & Suárez (1981)), acrescentou mais dados à estratigrafia regional. A estas camadas pode ser-lhe atribuída, com bastante certeza, a mesma idade, isto é, Pleistoceno Superior, daquelas da Argentina, correspondendo ao Lujanense (Pleistoceno Superior) nas quais figura Lestodon como um de seus fósseis característicos (Pascual, 1966).
MEDIDAS DE PROTEÇÃO
O sítio fossilífero , pela sua localização na antiga estrada de ferro
desativada e sem qualquer referência de sua localização (como marcos quilométricos),
está relativamente protegido da depredação. Além disto, o próprio abandono
fez com que a vegetação e as enxurradas ocultassem
o local, de modo que para o leigo será difícil visualizar a camada
fossilífera. Entretanto, a estrada de ferro pode ser refeita, já que
a construção da Usina Hidrelétrica Sérgio Motta (Porto Primavera),
permitiria a sua passagem para Mato Grosso do Sul. Neste caso, a própria
empresa proprietária da estrada de ferro poderia se encarregar de construir um
museu natural no lugar.
Mesmo
sem a estrada de ferro, aproveitando a trincheira e construindo um barracão
coberto, ter-se-ia um painel natural onde se poderiam ver, tanto os fósseis,
como as estruturas sedimentares, com grande proveito para estudantes e
cientistas. O local merece e o mapa parcial da folha topográfica PRESIDENTE
PRUDENTE SF-22-Y-B-III-1 (Figura 1) indica a localização exata.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Carvalho,A.M.V. 1952. Ocorrências de Lestodon trigonidens na mamalofauna de Álvares Machado. Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP,São Paulo, Boletim, 34, Geol. (7): 43-55.
Dias-Brito,D. et al. 1998. Cretaceous non marine calcareous microfossils from Adamantina Formation (Bauru Group) Western São Paulo, Brazil. Comodoro Rivadavia (Argentina): Asociación Paleontológica del Golfo de San Jorge. Boletim, 2:8-10.
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Leonardi,G. 1977. Two new ichnofaunas (vertebrates and invertebrates) in the eolian cretaceous sandstone of the Caiuá Formation in Northwest Paraná. Simpósio de Geologia Regional, São Paulo , 1977, Sociedade Brasileira de Geologia Regional. Atas: 112-128.
Lepsch,I.F. 1977. Superfícies geomorfológicas e depósitos superficiais Neocenozóicos em Echaporã, SP. Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, 53: 5-35.
Mezzalira,S. 1974. Contribuição ao conhecimento da estratigrafia e paleontologia do Arenito Bauru. Instituto Geográfico e Geológico, São Paulo. Boletim, 51, 163p.
Mezzalira, S. 1989. Os Fósseis do Estado de São Paulo. Instituto Geológico, São Paulo: 142 p, 13 est (Série Pesquisa).
Scorza,E.P. 1952. Considerações sobre o Arenito Caiuá. Departamento Nacional de Produção Mineral, Divisão de Geologia e Mineralogia, Rio de Janeiro. Boletim n. 139.
Soares,P.C. et al. 1980. Ensaio de caracterização estratigráfica do Cretáceo no Estado de São Paulo: Grupo Bauru. Revista Brasileira de Geociências(1980), 10(3): 177-185.
Suárez,J.M. 1969. Um quelônio da Formação Bauru. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 33, Salvador (BA) SBG. Anais: 168-176.
Suárez, J. M. 1973. Contribuição à Geologia do Extremo Oeste do Estado de São Paulo. Presidente Prudente: Faculdade de Ciências e Letras. (Tese de Doutoramento)
Suárez, J. M. 1991. A localização das cidades no extremo oeste do Estado de São Paulo e seus problemas. Memória del III Encuentro de Geógrafos de América Latina. México, Toluca, 1991.
Washburne,C.W. 1930. Petroleum Geology of State of São Paulo. Instituto Geográfico e Geológico,São Paulo. Boletim n. 22.
AGRADECIMENTOS Agradeço a colaboração da Profª. MSc. Encarnita Salas Martin e ao 5º anista de Engenharia Cartográfica Ítalo Tsuchiya pela edição gráfica e Wagner Carrupt Machado pela obtenção das coordenadas geográficas do sítio.
A P E N D I X